Justiça perversa...

Justiça perversa...

O Manuel e o João, são apenas dois meninos.
Nasceram no mesmo dia, na mesma rua, mas de pais diferentes. Cresceram juntos nas brincadeiras de crianças, na inocência dos seus sonhos do futuro.
Duas meninices idênticas, felizes, mesmo considerando a pobreza do bairro e a simplicidade dos pais. Não tiveram irmãos e conviveram de mãos dadas até à puberdade. Nas correrias, nos jogos de futebol, na educação das famílias humildes e cujos valores da humanidade eram preservados desde os primórdios das suas gerações.
Na escola, o Manuel apenas conseguiu terminar o 9.º ano de escolaridade, enquanto o João, seguiu os estudos e entrou na universidade. Foi o ponto da separação das suas vidas, que foram até então de uma osmose perfeita e cada um levou um novo rumo de vida.
O Manuel, entrou no mundo do trabalho, com apenas dezoito anos já carregava os sacos de cimento, a pá, a talocha e a colher da massa, na construção.
O João, esse mesmo a estudar, entrou num mundo diferente, na política. Os jogos de poder deslumbravam os seus sonhos e fazia de si um homem vaidoso. Dedicou-se cada vez mais à causa pública, aos corredores da habilidade e das táticas do regime democrático. Não terminou o curso, pois rapidamente percebeu que a força da sua influência, conseguiria contornar os poderes da universidade e recebeu de “mão beijada” o canudo. Num ápice, passou a ser tratado por senhor doutor, senhor engenheiro e muitos outros sinónimos. Egocêntrico, sedente do domínio, secou tudo e todos no seu redor, nunca olhando a meios para atingir os seus fins.
O Manuel, continuou na sua simplicidade, casou com uma pobre desempregada, teve cinco filhos e as dificuldades diárias eram constantes. Possuidor de uma educação assente nos valores morais, levava sempre uma vida de casa, trabalho e trabalho, casa.
Um dia veio a crise imobiliária, a construção parou e mergulhou no desemprego. No desespero diário, na extrema dificuldade de colocar a comida na mesa para os cinco filhos, para a esposa, nem pensava nele. Deitava-se muitas vezes com o estômago a roncar de vazio.
O João, nas cadeiras do poder na capital, na vida de ganância, não olhava a meios, mesmo através da corrupção, na ânsia de dar continuidade à sua vaidade e luxos. Tornou-se poderoso, subiu não a pulso da verdade, mas a ultrapassar os riscos da indecência moral. Um corrupto, acabou por ser preso preventivamente, numa cela de luxo, com tudo como se estivesse na sua casa, apenas privado da liberdade.
O Manuel, não resistiu ao sofrimento das lágrimas dos filhos pela fome e roubou umas pizas num hipermercado. Não teve sorte, não tinha jeito para roubar e foi apanhado em flagrante. Acabou preso, numa cela de segurança máxima, no meio dos escroques e dos maiores bandidos.
O João, foi a julgamento, o juiz, confirmou os indícios e provas da corrupção, mas prescreveu.
A vida é feita de oportunidades, mas primeiro de valores morais e humanos, portanto não devemos deixar cair na tentação de uma vida faustosa, mesmo sabendo que a justiça possa ser perversa.

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