Cartas de amor...

Cartas de amor...

O inverno remete-nos para um ambiente onde predominam os tons cinzentos e as lágrimas escorrem da alma mais facilmente como cascatas. Um período que criamos indecisões nos pensamentos, com os semáforos ligados para as ideias de bosta. Até os ganidos dos cães, ao longe, entoam na cabeça vazia e fazem desmoronar o perfecionismo doentio da felicidade.
Talvez precise reinventar prazeres, quem sabe escalar o Evereste, ou mergulhar num poço e esvoaçar nas emoções até estremecer a lava do ego. Prefiro ligar as luzes da ribalta e reviver os sopros da vida como uma andorinha na primavera.
Sempre fui um caçador de sonhos, um lutador resiliente pela lucidez de viver as loucuras, só assim consigo manter buliçosa a sanidade mental.
Espreito pela janela, a noite está branca, iluminada pelo arco-íris e o sol espelha no mar, tudo meras ilusões para esquecer as pontadas de ansiedade. 
Com as mãos quentes, aquecidas pelo chá açucarado com mel, em cada golada amacio as goelas e decido abrir os cacifos das memórias. Contém cartas, têm décadas, o papel está todo amarelado, mas mantém o aroma perfumado, como se fossem borboletas a flutuar sobre a moleira. Pego nelas com cuidado, são papiros, relíquias, com sílabas desconcertantes, muitas escritas com as cores dos rubis das amantes e para mim são verdadeiros hinos das paixões dos tempos da adolescência boémia.
Dou glórias aos pensamentos no mundo dos vivos e com os tímpanos afinados, ainda consigo ouvir as vivências do passado. Nas letras, nas frases, em cada parágrafo, existem traços marcantes, com soluços transpirados, labaredas que percorreram as veias e que ainda conseguem arrepiar o coração.
Deixo-me penetrar na alma por cada uma das epístolas, são testemunhos remotos, mas que logram beijos escondidos, viciantes e que deixam a boca seca e as pernas estremecidas.
É o diabo a tecer heresias no corpo, embora saiba que como amante da sedução, sou alérgico a assédios e tenho sempre à mão o extintor das excitações.
Repasso o olhar carta a carta, são cardápios de inúmeras histórias intensas, que quase consigo tocar novamente as curvaturas dos traços corporais e sentir-me iluminado pela nitescência dos olhares. Na pele ainda carrego as cicatrizes das setas do cúpido, são marcas profundas neste menino apaixonado, pela essência mulher. Como poeta, fico extasiado pela sua alma que inspira, pelo sorriso que ilumina, pelo corpo que alimenta desejo e pela sensualidade arrepiante. Estou tatuado no íntimo eternamente e ainda sinto a pele sedosa, colada em abraços como medusas enfeitiçadas.
Sei que apenas abri as gavetas das memórias, mas mesmo assim espero esta noite, por ti, para juntos escrevermos mais cartas de amor.
 
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