Confissões duma virgem…

Confissões duma virgem…

Dizem que só os poetas sabem escutar os batimentos da alma duma mulher, pelo que à noite tento ouvir os mais íntimos e por vezes escuto os seus segredos. Umas vezes são vozes embargadas pelas solidões, outras gemidos da paixão, mas hoje os tímpanos percecionam confissões…
Está longe, é a voz doce duma mulher, pelo que somente os ouvidos mais apurados conseguem captar e concentrado no silêncio profundo de coração aberto, ouço.
Ela desabafa: “Já não sou criança, já passei a fase da adolescência, não vivi e o tempo voou, como se fosse um fósforo arder. Sempre tive receios, da entrega do corpo ao sexo oposto, apenas entreguei o coração e mesmo esse não foi correspondido. Confesso às paredes que tenho momentos de indecisão, de arrependimentos, principalmente quando ouço as conversas das minhas amigas e colegas de trabalho. Ainda mantenho para mim desculpas esfarrapadas, mas já não conheço nenhuma como eu, virgem e ainda por cima fazem questão de contar as suas peripécias mais loucas e íntimas na cama. Na minha cabeça, muitas dessas histórias são verdadeiras loucuras, talvez a educação que tive seja a guilhotina que cortou a parte do lado erótico e nunca ter posto em prática as minhas fantasias. Sim, fantasias, também as tenho, o corpo por vezes sente a falta de algo, de saltar para o outro lado da fronteira e abraçar com força o desejo”.
Refastelado na minha cama, deixo a audição tomar conta dos outros quatro sentidos. É um sono de menina virgem, com os sonhos acordados e que sente um silêncio estranho na alma. Mas, ouço mais outras vozes, são os piropos das sombras dos homens escondidos e que a olham de esguelha.
E a voz continua…
“Esta luta diária dentro da cabeça e a cama é como a arena onde os gladiadores se defrontam em lutas de morte. Aqui os lutadores são os pensamentos éticos de uma educação ultrapassada e as hormonas que almejam a ilusão da bravura dos machos. Tenho instantes que a vontade é de arrancar os cabelos, de gritar hosanas nas alturas e entregar o corpo aos dialetos proibidos. Oh, difícil suportar esta espada sobre os pensamentos, quando o corpo está ardente e sinto arrepios suados. Não aguento mais, sem saber como será perder esta ingenuidade sexual e deixar o sangue fluir nas veias como um comboio louco. Sinto-me descontrolada, com os dedos incontroláveis, com as mãos a deslizar pelo ventre e possuída pela excitação na ânsia de romper o íman e manchar os lençóis de sangue. Ufa, é o que acaba de acontecer, vivo um momento único na clandestinidade da minha solidão e agora não vou parar de gritar e gemer até as lobas escutarem a minha felicidade! Meu Deus, até consegui atingir um orgasmo, que…que…que…gaguejo, nem sei explicar esta falta enorme de ar, o bater do coração e o sabor dos dedos com gosma que humedecem os lábios”.
Neste frenesim vindo de outro lado do mundo, feliz por sentir a felicidade da donzela, deixo o sono tomar conta de mim, enquanto ela se liberta através das confissões duma virgem.
 
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