Viagem da vida...
26 de Novembro, 2020
As luzes dos holofotes fundiram, os palcos das passarelas caíram, os fãs esconderam-se entre as quatro paredes de casa e o mundo desabou sobre a cabeça.
Uma top-model, um corpo desenhado pela perfeição, exuberante, com as medidas nos trinques e a essência feminina um reportório de sonho para os olhares.
Os flashes dos paparazzi desligados, as passadeiras encardidas, as viagens canceladas, tudo alterado por uma anormalidade monstruosa a nível mundial.
A pandemia veio, ceifou vidas e aniquilou sonhos.
Com acenos da saudade nas reflexões da vida, olhar distante, podia ser um pequeno descanso da guerreira, mas tornou-se numa princesa perdida, um talento que caiu como uma mosca.
Atormentada, a estrela perde o brilho e cada vez mais com pregos da amargura espetados na alma, entra numa órbita depressiva.
Um barco à deriva, carregada de raivas contidas e impiedosa consigo mesmo nos pensamentos negativos, fica constantemente a sentir murros no estômago.
Dá ouvidos aos pedidos silenciosos do diabo e começa a caminhar numa escada rolante que acabará por ser o corredor fatídico para uma morte lenta.
Num carrossel com linhas tortuosas, o vinho passa a ser o guia espiritual, o líquido purificador para subir a escada ao céu. Os neurónios cada vez mais com a luz intermitente, os suores em delírios enervantes, as batidas cardíacas fulminantes, acaba passada dos carretos.
Veste uma lingerie preta, pega numa garrafa de vodca, uma caixa de comprimidos Xanax e coloca as asas para voar na eutanásia.
Escolhe a casa de banho como a caverna das trevas, de cabelos soltos, com o olhar em transe, ruídos na mente, mete-se na banheira como se fosse a sua sepultura e encharca as células para entrar definitivamente no mundo sonolento.
À espera do momento fatídico, o diabo esfrega as mãos, lança uma chuva de nuvens negras e fica à escuta do roncar do sono eterno.
As labaredas do inferno rodeiam a banheira e os esqueletos dos mortos esbatem-se nos azulejos. Em falência física, o corpo mostra a brancura do gelo e o Belzebu com o punhal erguido à espera do revirar dos olhos para colocar a pedra do túmulo.
Pronta para o último suspiro de vida, solta uma lágrima que escorre pelo rosto e acende o pavio do sorriso.
Nesse preciso instante, surge um anjo da guarda e leva-a a voar numa viagem da vida para o Planeta Azul.
Respeita os direitos de autor.
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