Destinos (Des)cruzados…
23 de Abril, 2020
Sozinho de janela entreaberta, é nas gavetas de menino que encontro os lápis coloridos e pinto o arco-íris, em sinal da esperança. Colo a folha no monitor do PC e fico a ver vales sem fim, até encontrar as memórias da viagem perdida no verão escaldante. Uma história de amor de príncipes e princesas sem cavalos brancos. Em ti tudo foram sorrisos contagiantes, o brilho do olhar, o aroma do perfume, um frasco aberto, que ainda abunda encravado na pele. Deixei-me cair na escada rolante e segui as pegadas da paixão. Relembro a forma tímida como acedeste ao convite, o jantar romântico no aconchego do barco à vela, numa velocidade sonhadora e soprado pelo vento que embala.
Os assédios foram círios acesos, mas o champanhe despertou o teu jeito, uma surpresa em cada palavra, libertada nos lábios de beleza pincelada. Ainda sinto o aveludado do primeiro beijo, o cantinho perfumado da língua, as mãos quentes e o dilatar das veias. Atrevido na minha forma simples, com humor malicioso, intenso como vibro a cada segundo, conquistei o teu espaço íntimo.
Tiramos selfies da alma, rasgamos a nudez do corpo, penteamos arrepios e com o erotismo cravado, abrimos estímulos fervorosos. A cama há muito que era fria, já não sentia o prazer de ser o abrigo dos sonhos, onde apenas o travesseiro sussurrava pensamentos. Nesse dia, deixei de sentir a espinha encravada, foi como sair do crucifixo para uma nova vida e senti o ressuscitar do ego.
Cada viagem que faço à tua pátria, é como se fosse a primeira, um aconchego sentir o calor do teu corpo, o respirar soluçado, atrevido e assanhado, nos momentos de intimidade sem tabus. Ainda coras nas palavras, a cada dedo molhado que toca o corpo, mas estás muito mais liberta nas fantasias frenéticas e crias verdadeiros cenários carregados de vulcões.
O mundo mudou, uma página escondida gelada, escura e sombria, separou-nos pela proibição das viagens, restrições impostas neste tempo de insociabilidade.
Resta-me as recordações, com o coração palpitante, da ânsia pelo dia do reencontro, de amar e ser amado, sem coibição dos abraços, de novas corridas corporais, rastejar na mesma cama, com as peles molhadas e engomar contigo o corpo em viroses sexuais.
Estamos bem longe, em países diferentes, mas voltaremos a saltar, sorrir, voar, desejar, sonhar e amar, mesmo com destinos (des)cruzados.
Respeite os direitos de autor.
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